terça-feira, 29 de dezembro de 2009

TUDO ISSO É AMOR



Nada se compara com o Amor

porque o Amor não se compara a coisa alguma.

Brisa leve, tempestade

mar revolto, suavidade

maresia, furacão

vento norte ou Sião

tudo isso é Amor

tudo isso é Paixão!


O Amor tem destas coisas

coisas essas que não alcanço

coisas sempre inconcebíveis

desesperos apetecíveis

contrapontos, contradições

mistérios, segredos, paixões

espasmos de alegria e de dor.


E se alguém disser que não entende

que é possível sentir assim,

nunca ousou sofrer um pouco

ser livre, feliz e louco

porque tudo isso é Amor!


apl in 47 Poemas de Amor ©



terça-feira, 8 de dezembro de 2009

ONTEM


Ontem matei o dia sem saudade

sem lembranças, sem mágoas

sem ressentimentos, sem fráguas

sem tristezas, sem recordações.


Ontem não tem mais hora nem sentido

é tempo morto, tempo perdido

é sonho castrado de ilusões.


Ontem é estrada crua sem saída

é roupa rasgada e ferida

é corpo nu de masturbações.


apl in Mentes Perversas ©


quarta-feira, 21 de outubro de 2009

AQUI JAZ!

Já não há palavras nas coisas que escrevo

nem quinhentas pinturas de sois florescidos.

Aqui jaz a morte do meu pensamento.


Felizes os que não pensam nem se atormentam

nem falam, nem escrevem, nem coisa nenhuma

e se contentam com a missa de domingo

e o bailarico junto à Sé em dia de romaria.


Aqui jaz a morte do meu pensamento.


Nesta esquálida razão de quadras paralelas

nestes fios desordenados e sem ligação

nestes versos expostos a opiniões funestas

neste labirinto desordenado e clandestino.


Eis que me sepulto. E que descanse em paz.

Aqui jaz a morte do meu pensamento.



apl in Mentes Perversas ©

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

TODO O AMOR É ETERNO


Todo o Amor é eterno.

É eterno e dura eternamente.

Como as marés duram constantemente

Até a próxima maré voltar.

Como a Lua Cheia antes de ser minguante

Como a nortia antes de ser calmante

Como o nascente antes do sol se poisar.


Todo o Amor é eterno

É eterno e dura eternamente.

E enquanto dura que seja para sempre

Para sempre, até o Amor acabar!


apl in 47 Poemas de Amor


segunda-feira, 31 de agosto de 2009

A TABACARIA DO SR. ANTÓNIO




Aquela rua movimentada está diferente.
As grandes marcas capturaram as vitrinas
transformando-as em montras cobiçadas de luz
onde os olhos padecem e sonham sonhos desiguais.
Só a Tabacaria do Sr. António continua igual
naquela porta que também dá acesso ao primeiro andar
onde a luz se esconde atrás do bafio das escadas velhas .
A Tabacaria do Sr. António não tem luz nem vitrinas novas.
Apenas as rugas que o tempo transformou em velhice
iguais às rugas da velhice do Sr. António
iguais à velhice das rugas dos clientes do Sr. António.
E esses parecem querer acabar no tempo,
que o tempo os tem levado, como um dia levará o Sr. António.
Hoje os jovens não lêem o jornal. Passam os olhos nas letras
gordas, enquanto o café é devorado em segundos
porque o tempo não deixa tempo para mais.
Aqueles a quem resta tempo, partilham o jornal
no café da esquina mais perto de casa, no intervalo
de um qualquer jogo de futebol.
Mesmo assim, o Sr. António continua naquele sorriso
espelhado nos dentes desiguais àqueles que outrora foram seus,
a entregar todos os dias o jornal aos clientes,
enquanto vai comentando as notícias que enchem
a primeira página de um qualquer jornal.
Um dia, um senhor de fato e gravata entrara-lhe na Tabacaria.
Mas não queria o jornal.
Queria a Tabacaria!
Não queria aquelas prateleiras velhas.
Queria a Tabacaria!
Não queria o sorriso do Sr. António
Porque sem Tabacaria o Sr. António não sorri.
Só queria a Tabacaria!

apl in “Mentes Perversas”

terça-feira, 28 de julho de 2009

SILÊNCIO FRIO


Foi porque decidi ser assim

Que as palavras depressa sucumbiram

Dissecadas e sem lamento.


Ah, se soubesses que não escrevo

Nem historio nem me atrevo

A descobrir o que quero dizer.


Despedaçam-se os fólios passados

Desmancham-se os passos traçados

Mata-se a vontade de viver.


Resta apenas este chão vazio

Mistura de vinho acre e mosto seco

Fel, vinagre, e pecados que eu peco

Sepulcro amordaçado em silêncio frio.


apl in “Mentes Perversas” ©


terça-feira, 21 de julho de 2009

UM PEDAÇO DE... MORTE


Um pedaço de mar
Um quebranto na foz
Uma voz a falar
Um silêncio atroz.

Uma maré que grita
Um sexto sentido
Uma mão aflita
Um suor já gemido.

Uma estrela que morre
Um luar perecido
Uma palavra que sorve
Um combate morrido.

Uma estrada que geia
Um passo em desacerto
Um trecho que medeia
Um poema incerto.

Uma voz que limita
Um destino sem norte
Uma alma que grita
Um pedaço de morte!

apl in “Mentes Perversas” ©


sexta-feira, 17 de julho de 2009

OS LIMOS

Talvez os limos do mar

Deixados pela maré preia

Escrevam letras no silêncio

Que o mar escondeu na areia.


E as conchas ao murmurarem

Palavras de amor escondidas

Deixem inscritas na areia

As nossas palavras estendidas.


E nessa areia corada a limos

Que o mar amou sem pudor

Ficou escrito o que sentimos

No silêncio do nosso Amor.


apl in “47 Poemas de Amor” ©

terça-feira, 14 de julho de 2009

ESSE FANTASMA


Esse fantasma necrófago nem sequer tirou o chapéu

antes de entrar.

Falta se simetria no nevoeiro tornou-o imperceptível

e ele escapuliu-se.

De qualquer modo, não deixou a rudeza de fora.

Marmóreo e vítreo.

Que arrepio!

Torná-lo insignificante talvez fosse a solução.

Ignorar, simplesmente

e a transparência apoderar-se-á da sua delimitação

que o cheiro ficará inolente.

Já não o sinto

já ninguém o sente!


apl in “Mentes Perversas” ©



sábado, 4 de julho de 2009

A INVENÇÃO DO AMOR



O Amor não é mais que uma invenção dos sentidos

onde inventamos as invenções do corpo e da mente.

Não é mais que um paradoxo.

Seria um cepticismo, se não fosse uma constatação.

Somos prodigiosos na invenção.

Inventamos o mar, as flores, o pôr-do-sol,

e uma enormidade de expressões quixotescas.

Ridículo!

Devaneios que deveriam ser eliminados à nascença.

Não…

Nem sequer deveriam ter tempo para nascer.

Matá-los numa fase embrionária seria o mais razoável.

Evitavam-se o parto da entrega e o fluir da ilusão.

Tudo seria mais inteligível.

Trocar-se-iam prazeres momentâneos

por outros prazeres de igual expressão

sem dádivas interiores.

Uma troca simples e concreta. Um negócio.

Um contrato isento de assinaturas e promessas.

Não haveria lugar à sensação de entrega

e subsequente perda de uma parte de si.


Uma invenção!

Exactamente igual à invenção do Amor!


apl in “47 Poemas de Amor” ©



quinta-feira, 2 de julho de 2009

OS BÚZIOS




Quando os búzios acordarem
Nessa praia junto ao mar
Talvez o sol não se levante
Com medo de os despertar.

Porque entre cada grão de areia
Que a maré vaza não molhou
Ficaram escondidos segredos
Que a maré preia acautelou.

E se o sol fulgisse cedo
Mais cedo que o próprio alvor
Até os búzios saberiam
Que nos amamos sem pudor.

ana paula lavado ©



terça-feira, 30 de junho de 2009

A VERDADE DA MENTIRA


Como é espantosa a mente humana

capaz de grandes feitos e invenções

deste o fogo à penicilina

do LSD, à estricnina

até à bomba de neutrões!


Até houve quem inventasse o sol

a chuva, o raio e o trovão

o mar, os rios e as cores

a terra, as plantas e as flores

e ainda a polinização!


Tudo se inventa, tudo se transforma

nem a verdade foge ao achamento.

Aos gestos moldam-se os tons

às letras alteram-se os sons

e temos a mentira como invento!


apl in “Mentes Perversas” ©


sexta-feira, 26 de junho de 2009

A PORTA DA RUA


Ontem empurrei a porta da rua

com mais força do que o costume

e com ela empurrei a minha ira também.

Não sei se é costume

as outras pessoas empurrarem a porta da rua

quando querem empurrar a ira também.

Mas eu empurrei a porta da rua

e empurrei a minha ira também.


Amanhã não vou abrir a porta da rua.

E depois de amanhã

não vou abrir a porta da rua também.

Vão ficar as duas do lado de fora

vão ficar as duas do lado da rua

e do lado de dentro

a porta fica fechada também.


E quando a ira se for embora

e do lado de fora só estiver a porta da rua

eu vou abrir a porta da rua

e vou abrir a porta de dentro também.


apl in “Mentes Perversas” ©


sábado, 20 de junho de 2009

AMOR!


Julguei-me Rainha de mim

Livre, ousada, soberana.

Mas tudo é tão diferente

Quando a alma arde e sente

O fogo de quem nos ama!


E prostram-se todas a armas

Que pensamos erguer com ousadia.

Trocam-se as forças por um beijo

Transformam-se as vontades em desejo

Muda-se a vida por mais um dia!


E se alguém disser que é mentira

E que não existe tal ardor,

Nunca ousou ser livre e louco

Nunca trocou tudo por um pouco

De tudo aquilo que dá o Amor!


apl in “47 Poemas de Amor” ©


sexta-feira, 19 de junho de 2009

ELES VOLTAM!


isto é apenas

o presságio de um verso

um acesso de irritação

um acaso sem caso

um fantasma disperso


eles vêm sempre

como predadores

de garras secretas

destruidores

rondam a presa

para abordar


e voltam

e voltam

e voltam

para atacar


esses amantes

de ventres erectos

devassos, obscenos

impúdicos, abjectos

sem regra

sem lei

qual cio de animal


e voltam

e voltam

e voltam

como um chacal!


apl in “Mentes Perversas” ©


domingo, 14 de junho de 2009

ÀS SETE DA MANHÃ


Hoje deixei que a janela do meu quarto permanecesse quieta.

O silêncio das coisas termina para além daqueles vidros

onde a transparência se esconde atrás dum reposteiro.

Se a abrisse, talvez a calçada me lançasse em queixume

as maledicências que escutou às sete da manhã.

Não. Não vou ouvir. Não interessa ouvir falar

das coscuvilhices de que foi testemunha.

Vou permanece-la fechada por detrás da cortina

abafada no silêncio dum vidro que se tornou opaco.

Seria mais fácil ir apanhar ar. Deixar que as coisas

que não são naturais se tornassem naturais

e que a janela fechada se pudesse abrir

mesmo que fosse para escutar os queixumes da calçada.

E eu choraria com ela, porque essas coisas naturais

não passam de coisas que não são naturais,

mas existem como naturais, porque as pessoas as sentem naturais.


O sol é natural. A chuva é natural. Até a nortada

que me arrasta e desnorteia o pensamento, é natural.

O mar azul é natural, o mar cinzento é natural.

Até o mar verde que às sete da manhã se emerge

nos tons inigualáveis do nascente, é natural.

A vida deveria ser feita apenas de coisas naturais.

Seria mais fácil às sete da manhã abrir a janela

e cheirar o odor do canto dos pássaros, aspirar o prazer

com que o sol rompe cada pedaço da noite e a transforma.

É o ciclo natural da vida, tal como nascer e morrer.

Deveria ser natural abrir a janela às sete da manhã e deixar

que o silêncio do amanhecer inundasse o dia.

Mas às sete da manhã, ouço os queixumes da calçada.


E o mundo avança repleto de coisas que não são naturais

mas que aparecem como naturais, porque se querem com tal.

Mesmo os queixumes das pedras da calçada, que às sete da manhã

se reprimem para não contar as maledicências

que foram deixadas caídas nos seus pedaços!


apl in “Mentes Perversas” ©

domingo, 7 de junho de 2009

BOM SENSO


Nada temo na minha conduta. Não será perfeita. Mas quem atingiu a perfeição que a recrimine.
Caminho apenas com a convicção de que prefiro alhear-me das mentes insidiosas que calcam o mesmo chão que eu piso, consciente de que nada acrescentarão ao meu espírito, além de mediocridade.
Nada poderei contra os que não partilhem das minhas crenças e conceitos. Mas também nada farei para os demover da sua opinião. A liberdade de pensamento é sagrada, tal como são sagrados os Direitos Humanos.
É nesta base que rejo todas as minhas atitudes, mantendo-me céptica em relação ao futuro daqueles que se acham providos da certeza absoluta.
Procuro somente a verdade. O acto de duvidar é indubitável. Consequentemente, nada poderei acreditar, até que me possa ser provado.
E é nesta procura que continuarei a minha caminhada, enquanto a debilidade de pensamento não se apoderar das minhas fraquezas, e eu tiver lucidez e perseverança necessárias para que os meus conceitos sejam construídos com base nessa premissa.
E que Deus permita que o bom senso me acompanhe sempre!


O bom senso é a coisa mais bem distribuída do mundo: todos pensamos tê-lo em tal medida que até os mais difíceis de se contentar nas outras coisas não costumam desejar mais bom senso do que têm.”
( Renné Descartes)


ana paula lavado  ©

quarta-feira, 3 de junho de 2009

HISTÓRIAS DE ENCANTAR


Não há história
nesta história.
Morreu logo no prólogo,
antes do capítulo um
mesmo antes
do era uma vez!
Era uma vez
uma história com magia...
Como nos contos de fadas
com príncipes e princesas
e sapatinhos de cristal!
Com cenários do reino dourado
com tapetes voadores
lâmpadas de Aladino
e um monstro que não faz mal.
Com estrelas e um Sininho
uma Terra do Nunca
e até um Peter Pan...
Mas pensar nisso
é coisa vã.
Não que eu não soubesse
relatar toda a magia.
Mas o actor principal
desistiu do papel
logo antes do primeiro acto.
E sem actor...já não há peça.
Isso é um facto.
Troquemos então as voltas
e arranjemos outro actor.
Um daqueles que não desista
antes de o epilogo chegar.
E recomecemos a história
com reis, princesas
e sapatinhos de cristal,
o Sininho e o Peter Pan
e o monstro que não faz mal.
E que história comece
“Era uma vez
no reino de além-mar...
... e foram felizes para sempre!”
como nas histórias de encantar!


ana paula lavado in “Um Beijo… Sem Nome” ©


segunda-feira, 1 de junho de 2009

TUDO O QUE FUI... É NINGUÉM!





Quando eu morrer
não quero letras num epitáfio
nem lápide com inscrição.
Já nada mais farei
e o fiz, foi em vão.
A minha vida tem apenas dois momentos
o meu nascimento
e a minha morte.
Todo o resto foi casualidade
um intervalo efémero
sem pontualidade
e sem sorte.
E mesmo que algum momento
possa ter tido relevância
terá por qualquer acidente
perdido a sua importância.
Nada deixarei
que precise ser lembrado
ou guardado por alguém.
Já nada mais serei
e tudo o que fui
é ninguém!


apl in “Mentes Perversas” ©

domingo, 31 de maio de 2009

É APENAS SAUDADE, ASSIM!




Escrever mata a saudade
Pelo menos dizem os doutos.

Mas esta saudade que me arruína
Não morre nas letras que escrevo
Nem nas letras que não me atrevo
A tirar de dentro de mim.

É apenas saudade, assim!

É essa vontade de ter sempre
A lembrança desse chão quente
Nos braços de quem me desnudou.

É ter na mente quem me amou

É ter no corpo ainda o sal
Do fogo de tanto amar

É ter na pele aquele mar
Que vazou todo dentro de mim,

É apenas saudade, assim!


apl in “África” ©

quarta-feira, 27 de maio de 2009

AOS QUE NÃO DEIXAM MORRER O SONHO

"Teria de inventar uma forma especial, para agradecer a todos aqueles que me rodearam durante este último ano. Teria de escrever num registo diferente. Num sabor com outros aromas, outras fragrâncias, outras colorações. As letras não são fáceis. Providas de um sem número de combinações, deslumbram ou atordoam a mente, em conjugações complexas nem sempre fáceis de decifrar. Sentidos dúbios, sentidos duplos, sentidos sem sentido… Nem sempre as letras são suficientes para que as palavras tenham expressão. Incompletas ou incongruentes, acumulam-se desordenadamente em trilhos horizontais, que preenchem folhas incalculáveis de ideias incertas. Haverá os mais dotados, que as contornam e dominam, intemporalizando uma beleza inestimável de acordes musicais, fazendo uma verdadeira sinfonia de sabores, que nos preenche e ilumina o espírito. Talvez desses, tenhamos que «roubar» o ar que respiramos. Talvez nesses, possamos completar-nos nas nossas limitações. Talvez com esses, consigamos encontrar o verdadeiro sentido das palavras, com outros aromas, outras fragrâncias e outras colorações. Talvez com esses, fosse iluminada pelas palavras correctas, para que este agradecimento pudesse ter a dimensão certa."

Este texto foi publicado no livro "Um Beijo... Sem Nome", como agradecimento a sete pessoas, que de uma forma ou de outra, se tornaram imprescindíveis, tanto na minha vida, como na realização deste livro.
Hoje, ele aparece aqui, para agradecer a todos os que nestes últimos tempos me têm apoiado, para que o meu sonho não se suicide.

À B, ao ZB, ao R, ao J, à I,
A todos vós, o meu beijo... imenso!

quinta-feira, 21 de maio de 2009

BACK TO ÁFRICA




O ar quente que se nos abate logo que se pisa solo Angolano é sufocante. Sufocante e envolvente ao mesmo tempo. Mas quem ama África, sente-o como que balsâmico. Aquece-nos a alma, tornando-nos audazes, destemidos.
O despudor com que nos penetra na pele, faz-nos sentir como que parte de si. Não é em vão que muitas vezes digo que “Quem vai a África por um dia, ama África para toda a vida”.
África tem uma forma inesgotável de se amar. As cores têm outra cor, os cheiros outra intensidade, o chão, a marca indelével do sol africano: vermelho, intenso, quente e penetrante.

África!
A minha África é no pedaço ocidental a norte do deserto do Namib.
A minha África é aquele quadrado de terra vermelha que contempla o Atlântico, dando-lhe um sol para adormecer todos os dias.
A minha África é aquela que me viu nascer, aquela que me criou e me ensinou a amar sem limites ou restrições.
Deixá-la, foi como perder o primeiro amor. Sobrevive-se, mas jamais se esquece. E um dia reencontrado, despoletam-se todos os sentimentos religiosamente guardados, para que ninguém tivesse o despudor de os violentar.
África!
A única paixão que não é efémera, e que prolonga para além do tempo.

Senti-la, mais de três décadas depois, voltar a pisar o seu chão, a abraçar o seu cheiro, foi como recuperar um sonho perdido algures no tempo. Há sentires que não se reproduzem no papel. Incapazes de um adjectivo que os qualifique sem os desvirtuar, apenas se tornam descritíveis pelo olhar ou pelos gestos de quem os sente.


Luanda!
Luanda é apenas a visão da nossa memória consumida pelo tempo.
Não encontrei a Luanda que havia deixado. Não porque o tempo a tenha transformado, mas porque o tempo a destruiu. Os lugares passaram a ter uma cor soturna de anos de delapidação, desleixo e degradação, moldando-a numa paisagem dolorosa e quase dantesca. As chapas de zinco invadiram a cidade com o despudor e a arrogância da lei da sobrevivência. Retalhos consequentes de quase três décadas de guerra civil, onde o mais importante deixa de ser viver, para ser sobreviver.
Luanda é hoje fruto da invasão desmedida das populações do interior, em busca de um abrigo aparentemente mais seguro. A população multiplicou por dez, tornando a cidade completamente intransitável. Os musseques misturam-se e alongam-se desmesuradamente, fazendo do centro da cidade um círculo atrofiado e sufocante.

Durante o dia, Luanda é um verdadeiro caos. Uma amálgama de carros, onde a regra de transito que prevalece, é a regra do mais audaz.
A poeira existente no ar, mistura-se-nos na pele, conferindo-lhe um tom baço, que apenas o brilho do sol consegue disfarçar.
O tempo adquire uma outra dimensão. As horas deixam de ser horas, para se resumirem a ser apenas tempo. É impossível calcular o tempo, chegar a tempo, ou mesmo saber quanto tempo.
E chega a noite. A cidade adormece num silencio quase assustador. Mas Luanda adquire um brilho diferente. As ruas desertas recebem-nos com um tom mais familiar às memórias de outrora. A luz na noite dignifica-a, enobrecendo-a com o brilho do luar africano.
No intervalo destes dois contrastes, fica uma Luanda que parece querer nascer de novo. A reconstrução aparece-nos numa escala quase impossível de descrever. As construções novas multiplicam-se, numa arquitectura completamente deslumbrante. É uma outra Luanda a renascer, uma outra Luanda que nos irá apaixonar de novo.

Entre o que foi, o que é e o que será, está a Luanda que eu amo. A Luanda dos chinelos no chão quente, do sol com sabor a manga, da terra vermelha que nos aquece a alma.

Esta á a minha África. A África que tenho crivada na pele, a África pela qual eu dispo todo o Europeísmo que nunca me pertenceu.


apl in “África” ©

terça-feira, 19 de maio de 2009

OUT OF ÁFRICA

África Minha

Cheirei as picadas de poeira e sol quente
O odor do capim verde de Março
As cubatas barrentas da sua gente
Os sorrisos na face de qualquer abraço.

E amei sem pudor cada pedaço de chão
Matando o tempo que o tempo roubou.
Nada mais importa, nem mesmo a razão
Quando a alma pertence ao chão que a gerou.

Tive-te em meu corpo, África Minha
Trespassada na pele pelo sol ardente
Naquela paixão que só o amor adivinha
Naquele orgasmo que só o desejo consente.


apl in “África” ©

domingo, 17 de maio de 2009

FILHA DO MESMO SOL


Ali o verde é mais verde

Ali o verde cheira a verde

Ali tudo é verde

O ar cheira a verde

O Arco-íris é verde

Em tantos tons de verde

Que até o Sol seria verde

Se o verde dele não precisasse

Para ser verde.

Mas o Sol não é verde

Ali o sol é moreno

Que dá à pele negra mais moreno

Que dá à minha pele mais moreno

Que mesmo não sendo negra

É filha do mesmo sol!


apl in “África” ©

AREIA MORENA

Esses grãos

De areia morena

Que queimaram

Minha pele outrora,

Que trago na lembrança

Que trago na memória.

Como a sinto,

Como a tenho

Como a amo,

Como a mantenho

Presa em mim,

Assim tão presa

Misto de saudade,

Misto de tristeza,

Areia morena

Areia do meu sal

Lágrima fecunda

Assim plangente

Em água de sal.


ana paula lavado in “África” ©

sexta-feira, 15 de maio de 2009

O MEU POEMA SEM NOME

De que nos serve, na quarta à noite,
naquele bar de artistas,
confundirmos a personagem
e tomarmos para nós
o papel principal!
Nem a solidão nos abandona sem deixar recado,
nem as palavras que são ditas
com coragem ou com despudor,
nos alheiam da nossa memória.
Os olhares vagueiam,
os rostos transfiguram-se,
distraídos do cansaço
ou submersos num copo de agonia!
Esquecem-se as vontades e as dores,
enquanto a noite
se prolonga e desajusta da hora marcada.
O silêncio absorve-nos, arrebata-nos
e alheia-nos da verdade.
Só a solidão se senta a nosso lado e nos provoca.
Sorri, maldosa e incomplacente,
e vai-nos enchendo
o copo vazio com outra dor.
Mas a alma permanece intacta.
Resiste estoicamente,
trazendo dentro de si mais uma poesia sem nome,
dolorosa ou sem pudor,
que vai enchendo de ouro
um qualquer papel amarrotado
onde se escreve
um qualquer poema sem nome!

apl in "Um Beijo... Sem Nome" ©

quinta-feira, 14 de maio de 2009

"VELUDO AZUL" DE JORGE D'ALÉM MAR

Ontem foi dia de “Púcaros com Poesia”.
Como todas as quartas à noite, a casa enche-se de rostos, que roubam horas ao sono, para poderem partilhar uma paixão comum. Rostos, já familiares e cúmplices, em que aquilo que transmitem não precisa ser feito de palavras. Palavras, essas sim, aquelas que se vão desenrolando ao longo da noite e vão preenchendo o silêncio, apenas a das inúmeras Poesias a quem alguma voz empresta a alma.

Ontem foi dia de “Púcaros com Poesia”.
Mas ontem a Poesia foi diferente.
Ontem, a voz e a alma pertenciam a Jorge d’Além-Mar.
Irreverente, audaz, controverso. Apaixonado pelo Amor, deixou as linhas deste seu último livro, desaguarem num erotismo selvagem e despudorado.
O seu estilo é único. “Jorgiano”, como em tom de brincadeira costumo dizer, seduz-nos pela forma intempestiva com que redobra as palavras, fazendo delas um jogo constante.
A Poesia do Jorge, ou se ama, ou se detesta.
Indubitavelmente, eu faço parte daqueles que a sentem na alma, sorvendo cada palavra como se parte dela fizesse.
Não é este livro que afirma o Jorge como Poeta.
O Jorge já nasceu poeta.
Poeta em toda a essência da palavra, como se as letras dele nascessem, sem necessidade de parto.

Ontem foi dia de “Púcaros com Poesia”.
Mas ontem a Poesia foi diferente.
“Embrulhados” em azul, ontem estenderam-se os sonhos, nas páginas que deram corpo a “Veludo Azul”.

“Veludo Azul”.
Ao última obra de Jorge d’Além-Mar, que transformou mais uma quarta à noite, numa noite diferente de todas as quartas à noite, onde se vai deixando num qualquer papel amarrotado, uma qualquer Poesia sem nome.

Para ti, Jorge, o meu obrigada, por me dares a honra de ter partilhado contigo, este momento tão único e tão especial.

Hannah

quarta-feira, 13 de maio de 2009

SOTURNO


I

Ò rio
de pedras calejado
de penumbras açoitado
guardas a morte
em calabouços tenazes
onde os escombros fumegam
onde os túmulos de desapegam
onde tudo é má sorte.

II

E eis
onde o céu se abate
onde o ódio desperta
onde o rancor ilumina.

Porquê tão triste sina?


III

Que mais farei
se me ocultas
se me renegas
se me descarnas em dor!

Se transformas a luz em treva
se apodreces a alma
se só me dás desamor !


IV

Quantas noites
esperei que o aurorescer
iluminasse meus passos.

Sentimentos graníticos!
Só trazes lama
duma lava em chama
que só acende meus gritos.


V

Aguda labareda que queimaste
o fulgor de meus pulmões.
Num degredo árido
onde só o ódio desperta,
tornaste
a vida em lava de vulcões.


VI

Sucumbo à dor
em tua cripta
num arrepio tenaz
que dilacera a alma.

Gélida agonia
gélido tumulto
que me condenas ao teu sepulcro.

VII

Degredo que me levaste
e apodreceste em escuridão.
Lapidaste,
esculpiste em pedra escura.
Nem sálicos horrores
trariam tanta amargura.


VIII

E a noite
gélida e ácida de penumbras
ri e escarnece
enquanto a alma apodrece.

Nem a morte é tão fria
nem as lápides da agonia
pesam tanto no chão.

Incestuosa solidão!


IX

Ò rio
de pedras calejado
de penumbras açoitado
guardas a morte.
Em calabouços de pranto
em túmulos de desencanto
em destinos de má sorte.


apl in “Vozes do Vento” ©

domingo, 10 de maio de 2009

TALVEZ


Talvez um dia te saiba
em que lugar te vou guardar
em que sol eu vou amar
em que mundo te terei.
Não tenho pressa
mesmo que a ânsia seja essa
nas palavras que não direi.

Talvez um dia me desnude
talvez um dia te sinta
talvez um dia te minta
nas palavras que eu não sei.

Talvez um dia venha a saber
quais as palavras que desejo
quais os montes que anseio
quais os mares que me despirão.
Não temo a sorte
não temo a morte.
Talvez me vá sem norte
talvez me fique em solidão!


apl in “47 Poemas de Amor” ©

VINHO SEM MOSTO



Saturam-me as mentes minguadas
Vis, insanas, retardadas
Exíguas na expressão.
As que não agem
As que não obram
As que vivem de podridão.
As que se pensam soberbas
E se reconhecem donas da razão.

Falsas, mesquinhas, medíocres
Providas de medida demarcada
De arrogância adulterada
Tal como vinho sem mosto
Em rótulo de realeza.

Duma coisa tenho a certeza
Mesmo que matem minha verdade
Jamais matarão minha grandeza!


apl in “Mentes Perversas” ©

sábado, 9 de maio de 2009

SÓ TU !

Amordaçam-se as memórias
das palavras.
Linhas supérfluas
gastas de imaginação
de um transformismo acromático.
Ter ou não ter
é vazio de expressão
num verso metamórfico
ou numa metafísica encapsulada.

Não há céu nem limite.
Não há fantasmas alegóricos
nem utopias fantasiadas.
Só tu
vagabundo na memória
fugitivo num silêncio revolucionário.

A viagem
pintaste-a na solidão
que a irreverência deixou por preencher.
E rasgas a vontade agonizada
num desejo negado
sem convicção.

Ontem fui à baixa.
As ruas desertas
estavam cheias
da tua ânsia desmesurada.

Mas não é na baixa que me vais encontrar!


ana paula lavado in “Mentes Perversas” ©

terça-feira, 5 de maio de 2009

DESLEMBRA-ME!

Já não se apregoam virtudes
e a esperança está morta.
Escrever é talvez uma ironia
Mas que importa?

Deslembra-me,
deslembra-me que existo!
Porque já não escrevo
nem me deixo escrever
por letras insanas e loucas.

As palavras não existem
e as que restam são poucas.

Mas que importa?
Já não se apregoam virtudes
e a esperança está morta.

apl in “Mentes Perversas” ©

segunda-feira, 4 de maio de 2009

O MEU POEMA SEM NOME

De que nos serve, na quarta à noite,
naquele bar de artistas,
confundirmos a personagem
e tomarmos para nós
o papel principal!
Nem a solidão nos abandona sem deixar recado,
nem as palavras que são ditas
com coragem ou com despudor,
nos alheiam da nossa memória.
Os olhares vagueiam,
os rostos transfiguram-se,
distraídos do cansaço
ou submersos num copo de agonia!
Esquecem-se as vontades e as dores,
enquanto a noite
se prolonga e desajusta da hora marcada.
O silêncio absorve-nos, arrebata-nos
e alheia-nos da verdade.
Só a solidão se senta a nosso lado e nos provoca.
Sorri, maldosa e incomplacente,
e vai-nos enchendo
o copo vazio com outra dor.
Mas a alma permanece intacta.
Resiste estoicamente,
trazendo dentro de si mais uma poesia sem nome,
dolorosa ou sem pudor,
que vai enchendo de ouro
um qualquer papel amarrotado
onde se escreve
um qualquer poema sem nome!

apl in "Um Beijo... Sem Nome" ©

domingo, 3 de maio de 2009

CASTELOS DE AREIA


Quem nunca construiu o seu?
Castelos de areia. Sonhos onde qualquer criança navega no mundo do imaginário e do fantástico. As histórias de encantar são transpostas na imaginação fértil daquelas cabecinhas, que fantasiam Reinos de Princesas e Aladinos, Gnomos e Histórias de Além-mar.
E os castelos emergem, em flancos de areia roubada ao mar, enquanto a maré vaza os contempla e vê crescer. Os rostos brilham a cada grão colocado no topo, e o sonho torna-se cada vez mais alto e delirante. As imagens reflectem-se, e o mar transforma-se numa tela infinda, adornada pelas cores que o sol divulga.

E num impulso, tudo se acaba.
A maré agiganta-se, vindo buscar todos os grãos de areia que havia deixado para trás. Um a um, vai roubando o contorno de cada castelo erigido. O sonho desvanece-se em cada lágrima escorrida no rosto daqueles arquitectos em miniatura, que arduamente tentaram edificar um pedaço de fantasia.

Será que algum dia desistimos de construir os nossos castelos de areia?
Talvez sim, aqueles para quem a vida não tem mais objectivos, aqueles que se sentem felizes dentro da sua limitação, e aos quais a força, o incentivo e a vontade, são palavras excluídas do dicionário. Mas esses são também os que já escreveram o seu próprio epitáfio e apenas esperam comodamente a hora do juízo final.

Os outros, a quem a imaginação ajuda, e a vontade se renasce, e a quem a maré preia não aniquila o sonho, reconstroem seus castelos na próxima maré vaza… mesmo que seja apenas até a maré preia voltar!
apl in "Crónicas Dispersas"

quinta-feira, 30 de abril de 2009

A DOR

A dor é um cárcere permanente
uma clausura embriagada e demente
um destino trasladado em reclusão.

É um cântico adoçado com veneno
um ritual sorumbático e obsceno
uma esperança morta na incubação!

É uma luta de raiva e de tormento
um fustigar de medo e de lamento
uma dor que se acrescenta a outra dor.

É a alma delida num fogo prolongado
é a denúncia de um viver inanimado
é a morte anunciada ao pormenor!


apl in "Um Beijo... Sem Nome" ©

segunda-feira, 27 de abril de 2009

DESCONCERTO


Nada me desconcerta mais
que a falta de carácter.
Desdenhosos personagens
que me invadem o sossego
e desatinam qualquer complacência.
Ainda não descobri se é normal esta atitude
ou serei eu,
que depois de tanta ausência
desconheço as leis fundamentais.
Mas não deixo de ficar perturbada
e nem com toda a lógica em aumento
entenderei estas atitudes
que de serem tão anormais
não têm qualquer fundamento.
Não concebo o uso de qualquer alguém
só porque no momento é proveitoso.
E por mais que atropele
o meu humilde convencimento
certeza tenho que não há ninguém
que possa ser nobre com tal procedimento.
Mas de um lado ou outro sempre encontro
aqui ou além um certo desconcerto.
Ou será o mundo que anda todo desconcertado
ou serei eu que não lhe vejo qualquer acerto!


apl in "Um Beijo... Sem Nome" ©

domingo, 26 de abril de 2009

AMAR-TE


Ali, onde o Sol se poenta
naquele rubro quente
que entontece,
estendo-me
como quem adormece
com teu corpo
imerso em mim.

Amar-te
é assim esse lume
que atordoa
e enlouquece,
é esse mar
que se agita
e estremece,
essa maré
que ninguém pode vazar!

apl in "47 Poemas de Amor" ©