domingo, 31 de maio de 2009

É APENAS SAUDADE, ASSIM!




Escrever mata a saudade
Pelo menos dizem os doutos.

Mas esta saudade que me arruína
Não morre nas letras que escrevo
Nem nas letras que não me atrevo
A tirar de dentro de mim.

É apenas saudade, assim!

É essa vontade de ter sempre
A lembrança desse chão quente
Nos braços de quem me desnudou.

É ter na mente quem me amou

É ter no corpo ainda o sal
Do fogo de tanto amar

É ter na pele aquele mar
Que vazou todo dentro de mim,

É apenas saudade, assim!


apl in “África” ©

quarta-feira, 27 de maio de 2009

AOS QUE NÃO DEIXAM MORRER O SONHO

"Teria de inventar uma forma especial, para agradecer a todos aqueles que me rodearam durante este último ano. Teria de escrever num registo diferente. Num sabor com outros aromas, outras fragrâncias, outras colorações. As letras não são fáceis. Providas de um sem número de combinações, deslumbram ou atordoam a mente, em conjugações complexas nem sempre fáceis de decifrar. Sentidos dúbios, sentidos duplos, sentidos sem sentido… Nem sempre as letras são suficientes para que as palavras tenham expressão. Incompletas ou incongruentes, acumulam-se desordenadamente em trilhos horizontais, que preenchem folhas incalculáveis de ideias incertas. Haverá os mais dotados, que as contornam e dominam, intemporalizando uma beleza inestimável de acordes musicais, fazendo uma verdadeira sinfonia de sabores, que nos preenche e ilumina o espírito. Talvez desses, tenhamos que «roubar» o ar que respiramos. Talvez nesses, possamos completar-nos nas nossas limitações. Talvez com esses, consigamos encontrar o verdadeiro sentido das palavras, com outros aromas, outras fragrâncias e outras colorações. Talvez com esses, fosse iluminada pelas palavras correctas, para que este agradecimento pudesse ter a dimensão certa."

Este texto foi publicado no livro "Um Beijo... Sem Nome", como agradecimento a sete pessoas, que de uma forma ou de outra, se tornaram imprescindíveis, tanto na minha vida, como na realização deste livro.
Hoje, ele aparece aqui, para agradecer a todos os que nestes últimos tempos me têm apoiado, para que o meu sonho não se suicide.

À B, ao ZB, ao R, ao J, à I,
A todos vós, o meu beijo... imenso!

quinta-feira, 21 de maio de 2009

BACK TO ÁFRICA




O ar quente que se nos abate logo que se pisa solo Angolano é sufocante. Sufocante e envolvente ao mesmo tempo. Mas quem ama África, sente-o como que balsâmico. Aquece-nos a alma, tornando-nos audazes, destemidos.
O despudor com que nos penetra na pele, faz-nos sentir como que parte de si. Não é em vão que muitas vezes digo que “Quem vai a África por um dia, ama África para toda a vida”.
África tem uma forma inesgotável de se amar. As cores têm outra cor, os cheiros outra intensidade, o chão, a marca indelével do sol africano: vermelho, intenso, quente e penetrante.

África!
A minha África é no pedaço ocidental a norte do deserto do Namib.
A minha África é aquele quadrado de terra vermelha que contempla o Atlântico, dando-lhe um sol para adormecer todos os dias.
A minha África é aquela que me viu nascer, aquela que me criou e me ensinou a amar sem limites ou restrições.
Deixá-la, foi como perder o primeiro amor. Sobrevive-se, mas jamais se esquece. E um dia reencontrado, despoletam-se todos os sentimentos religiosamente guardados, para que ninguém tivesse o despudor de os violentar.
África!
A única paixão que não é efémera, e que prolonga para além do tempo.

Senti-la, mais de três décadas depois, voltar a pisar o seu chão, a abraçar o seu cheiro, foi como recuperar um sonho perdido algures no tempo. Há sentires que não se reproduzem no papel. Incapazes de um adjectivo que os qualifique sem os desvirtuar, apenas se tornam descritíveis pelo olhar ou pelos gestos de quem os sente.


Luanda!
Luanda é apenas a visão da nossa memória consumida pelo tempo.
Não encontrei a Luanda que havia deixado. Não porque o tempo a tenha transformado, mas porque o tempo a destruiu. Os lugares passaram a ter uma cor soturna de anos de delapidação, desleixo e degradação, moldando-a numa paisagem dolorosa e quase dantesca. As chapas de zinco invadiram a cidade com o despudor e a arrogância da lei da sobrevivência. Retalhos consequentes de quase três décadas de guerra civil, onde o mais importante deixa de ser viver, para ser sobreviver.
Luanda é hoje fruto da invasão desmedida das populações do interior, em busca de um abrigo aparentemente mais seguro. A população multiplicou por dez, tornando a cidade completamente intransitável. Os musseques misturam-se e alongam-se desmesuradamente, fazendo do centro da cidade um círculo atrofiado e sufocante.

Durante o dia, Luanda é um verdadeiro caos. Uma amálgama de carros, onde a regra de transito que prevalece, é a regra do mais audaz.
A poeira existente no ar, mistura-se-nos na pele, conferindo-lhe um tom baço, que apenas o brilho do sol consegue disfarçar.
O tempo adquire uma outra dimensão. As horas deixam de ser horas, para se resumirem a ser apenas tempo. É impossível calcular o tempo, chegar a tempo, ou mesmo saber quanto tempo.
E chega a noite. A cidade adormece num silencio quase assustador. Mas Luanda adquire um brilho diferente. As ruas desertas recebem-nos com um tom mais familiar às memórias de outrora. A luz na noite dignifica-a, enobrecendo-a com o brilho do luar africano.
No intervalo destes dois contrastes, fica uma Luanda que parece querer nascer de novo. A reconstrução aparece-nos numa escala quase impossível de descrever. As construções novas multiplicam-se, numa arquitectura completamente deslumbrante. É uma outra Luanda a renascer, uma outra Luanda que nos irá apaixonar de novo.

Entre o que foi, o que é e o que será, está a Luanda que eu amo. A Luanda dos chinelos no chão quente, do sol com sabor a manga, da terra vermelha que nos aquece a alma.

Esta á a minha África. A África que tenho crivada na pele, a África pela qual eu dispo todo o Europeísmo que nunca me pertenceu.


apl in “África” ©

terça-feira, 19 de maio de 2009

OUT OF ÁFRICA

África Minha

Cheirei as picadas de poeira e sol quente
O odor do capim verde de Março
As cubatas barrentas da sua gente
Os sorrisos na face de qualquer abraço.

E amei sem pudor cada pedaço de chão
Matando o tempo que o tempo roubou.
Nada mais importa, nem mesmo a razão
Quando a alma pertence ao chão que a gerou.

Tive-te em meu corpo, África Minha
Trespassada na pele pelo sol ardente
Naquela paixão que só o amor adivinha
Naquele orgasmo que só o desejo consente.


apl in “África” ©

domingo, 17 de maio de 2009

FILHA DO MESMO SOL


Ali o verde é mais verde

Ali o verde cheira a verde

Ali tudo é verde

O ar cheira a verde

O Arco-íris é verde

Em tantos tons de verde

Que até o Sol seria verde

Se o verde dele não precisasse

Para ser verde.

Mas o Sol não é verde

Ali o sol é moreno

Que dá à pele negra mais moreno

Que dá à minha pele mais moreno

Que mesmo não sendo negra

É filha do mesmo sol!


apl in “África” ©

AREIA MORENA

Esses grãos

De areia morena

Que queimaram

Minha pele outrora,

Que trago na lembrança

Que trago na memória.

Como a sinto,

Como a tenho

Como a amo,

Como a mantenho

Presa em mim,

Assim tão presa

Misto de saudade,

Misto de tristeza,

Areia morena

Areia do meu sal

Lágrima fecunda

Assim plangente

Em água de sal.


ana paula lavado in “África” ©

sexta-feira, 15 de maio de 2009

O MEU POEMA SEM NOME

De que nos serve, na quarta à noite,
naquele bar de artistas,
confundirmos a personagem
e tomarmos para nós
o papel principal!
Nem a solidão nos abandona sem deixar recado,
nem as palavras que são ditas
com coragem ou com despudor,
nos alheiam da nossa memória.
Os olhares vagueiam,
os rostos transfiguram-se,
distraídos do cansaço
ou submersos num copo de agonia!
Esquecem-se as vontades e as dores,
enquanto a noite
se prolonga e desajusta da hora marcada.
O silêncio absorve-nos, arrebata-nos
e alheia-nos da verdade.
Só a solidão se senta a nosso lado e nos provoca.
Sorri, maldosa e incomplacente,
e vai-nos enchendo
o copo vazio com outra dor.
Mas a alma permanece intacta.
Resiste estoicamente,
trazendo dentro de si mais uma poesia sem nome,
dolorosa ou sem pudor,
que vai enchendo de ouro
um qualquer papel amarrotado
onde se escreve
um qualquer poema sem nome!

apl in "Um Beijo... Sem Nome" ©

quinta-feira, 14 de maio de 2009

"VELUDO AZUL" DE JORGE D'ALÉM MAR

Ontem foi dia de “Púcaros com Poesia”.
Como todas as quartas à noite, a casa enche-se de rostos, que roubam horas ao sono, para poderem partilhar uma paixão comum. Rostos, já familiares e cúmplices, em que aquilo que transmitem não precisa ser feito de palavras. Palavras, essas sim, aquelas que se vão desenrolando ao longo da noite e vão preenchendo o silêncio, apenas a das inúmeras Poesias a quem alguma voz empresta a alma.

Ontem foi dia de “Púcaros com Poesia”.
Mas ontem a Poesia foi diferente.
Ontem, a voz e a alma pertenciam a Jorge d’Além-Mar.
Irreverente, audaz, controverso. Apaixonado pelo Amor, deixou as linhas deste seu último livro, desaguarem num erotismo selvagem e despudorado.
O seu estilo é único. “Jorgiano”, como em tom de brincadeira costumo dizer, seduz-nos pela forma intempestiva com que redobra as palavras, fazendo delas um jogo constante.
A Poesia do Jorge, ou se ama, ou se detesta.
Indubitavelmente, eu faço parte daqueles que a sentem na alma, sorvendo cada palavra como se parte dela fizesse.
Não é este livro que afirma o Jorge como Poeta.
O Jorge já nasceu poeta.
Poeta em toda a essência da palavra, como se as letras dele nascessem, sem necessidade de parto.

Ontem foi dia de “Púcaros com Poesia”.
Mas ontem a Poesia foi diferente.
“Embrulhados” em azul, ontem estenderam-se os sonhos, nas páginas que deram corpo a “Veludo Azul”.

“Veludo Azul”.
Ao última obra de Jorge d’Além-Mar, que transformou mais uma quarta à noite, numa noite diferente de todas as quartas à noite, onde se vai deixando num qualquer papel amarrotado, uma qualquer Poesia sem nome.

Para ti, Jorge, o meu obrigada, por me dares a honra de ter partilhado contigo, este momento tão único e tão especial.

Hannah

quarta-feira, 13 de maio de 2009

SOTURNO


I

Ò rio
de pedras calejado
de penumbras açoitado
guardas a morte
em calabouços tenazes
onde os escombros fumegam
onde os túmulos de desapegam
onde tudo é má sorte.

II

E eis
onde o céu se abate
onde o ódio desperta
onde o rancor ilumina.

Porquê tão triste sina?


III

Que mais farei
se me ocultas
se me renegas
se me descarnas em dor!

Se transformas a luz em treva
se apodreces a alma
se só me dás desamor !


IV

Quantas noites
esperei que o aurorescer
iluminasse meus passos.

Sentimentos graníticos!
Só trazes lama
duma lava em chama
que só acende meus gritos.


V

Aguda labareda que queimaste
o fulgor de meus pulmões.
Num degredo árido
onde só o ódio desperta,
tornaste
a vida em lava de vulcões.


VI

Sucumbo à dor
em tua cripta
num arrepio tenaz
que dilacera a alma.

Gélida agonia
gélido tumulto
que me condenas ao teu sepulcro.

VII

Degredo que me levaste
e apodreceste em escuridão.
Lapidaste,
esculpiste em pedra escura.
Nem sálicos horrores
trariam tanta amargura.


VIII

E a noite
gélida e ácida de penumbras
ri e escarnece
enquanto a alma apodrece.

Nem a morte é tão fria
nem as lápides da agonia
pesam tanto no chão.

Incestuosa solidão!


IX

Ò rio
de pedras calejado
de penumbras açoitado
guardas a morte.
Em calabouços de pranto
em túmulos de desencanto
em destinos de má sorte.


apl in “Vozes do Vento” ©

domingo, 10 de maio de 2009

TALVEZ


Talvez um dia te saiba
em que lugar te vou guardar
em que sol eu vou amar
em que mundo te terei.
Não tenho pressa
mesmo que a ânsia seja essa
nas palavras que não direi.

Talvez um dia me desnude
talvez um dia te sinta
talvez um dia te minta
nas palavras que eu não sei.

Talvez um dia venha a saber
quais as palavras que desejo
quais os montes que anseio
quais os mares que me despirão.
Não temo a sorte
não temo a morte.
Talvez me vá sem norte
talvez me fique em solidão!


apl in “47 Poemas de Amor” ©

VINHO SEM MOSTO



Saturam-me as mentes minguadas
Vis, insanas, retardadas
Exíguas na expressão.
As que não agem
As que não obram
As que vivem de podridão.
As que se pensam soberbas
E se reconhecem donas da razão.

Falsas, mesquinhas, medíocres
Providas de medida demarcada
De arrogância adulterada
Tal como vinho sem mosto
Em rótulo de realeza.

Duma coisa tenho a certeza
Mesmo que matem minha verdade
Jamais matarão minha grandeza!


apl in “Mentes Perversas” ©

sábado, 9 de maio de 2009

SÓ TU !

Amordaçam-se as memórias
das palavras.
Linhas supérfluas
gastas de imaginação
de um transformismo acromático.
Ter ou não ter
é vazio de expressão
num verso metamórfico
ou numa metafísica encapsulada.

Não há céu nem limite.
Não há fantasmas alegóricos
nem utopias fantasiadas.
Só tu
vagabundo na memória
fugitivo num silêncio revolucionário.

A viagem
pintaste-a na solidão
que a irreverência deixou por preencher.
E rasgas a vontade agonizada
num desejo negado
sem convicção.

Ontem fui à baixa.
As ruas desertas
estavam cheias
da tua ânsia desmesurada.

Mas não é na baixa que me vais encontrar!


ana paula lavado in “Mentes Perversas” ©

terça-feira, 5 de maio de 2009

DESLEMBRA-ME!

Já não se apregoam virtudes
e a esperança está morta.
Escrever é talvez uma ironia
Mas que importa?

Deslembra-me,
deslembra-me que existo!
Porque já não escrevo
nem me deixo escrever
por letras insanas e loucas.

As palavras não existem
e as que restam são poucas.

Mas que importa?
Já não se apregoam virtudes
e a esperança está morta.

apl in “Mentes Perversas” ©

segunda-feira, 4 de maio de 2009

O MEU POEMA SEM NOME

De que nos serve, na quarta à noite,
naquele bar de artistas,
confundirmos a personagem
e tomarmos para nós
o papel principal!
Nem a solidão nos abandona sem deixar recado,
nem as palavras que são ditas
com coragem ou com despudor,
nos alheiam da nossa memória.
Os olhares vagueiam,
os rostos transfiguram-se,
distraídos do cansaço
ou submersos num copo de agonia!
Esquecem-se as vontades e as dores,
enquanto a noite
se prolonga e desajusta da hora marcada.
O silêncio absorve-nos, arrebata-nos
e alheia-nos da verdade.
Só a solidão se senta a nosso lado e nos provoca.
Sorri, maldosa e incomplacente,
e vai-nos enchendo
o copo vazio com outra dor.
Mas a alma permanece intacta.
Resiste estoicamente,
trazendo dentro de si mais uma poesia sem nome,
dolorosa ou sem pudor,
que vai enchendo de ouro
um qualquer papel amarrotado
onde se escreve
um qualquer poema sem nome!

apl in "Um Beijo... Sem Nome" ©

domingo, 3 de maio de 2009

CASTELOS DE AREIA


Quem nunca construiu o seu?
Castelos de areia. Sonhos onde qualquer criança navega no mundo do imaginário e do fantástico. As histórias de encantar são transpostas na imaginação fértil daquelas cabecinhas, que fantasiam Reinos de Princesas e Aladinos, Gnomos e Histórias de Além-mar.
E os castelos emergem, em flancos de areia roubada ao mar, enquanto a maré vaza os contempla e vê crescer. Os rostos brilham a cada grão colocado no topo, e o sonho torna-se cada vez mais alto e delirante. As imagens reflectem-se, e o mar transforma-se numa tela infinda, adornada pelas cores que o sol divulga.

E num impulso, tudo se acaba.
A maré agiganta-se, vindo buscar todos os grãos de areia que havia deixado para trás. Um a um, vai roubando o contorno de cada castelo erigido. O sonho desvanece-se em cada lágrima escorrida no rosto daqueles arquitectos em miniatura, que arduamente tentaram edificar um pedaço de fantasia.

Será que algum dia desistimos de construir os nossos castelos de areia?
Talvez sim, aqueles para quem a vida não tem mais objectivos, aqueles que se sentem felizes dentro da sua limitação, e aos quais a força, o incentivo e a vontade, são palavras excluídas do dicionário. Mas esses são também os que já escreveram o seu próprio epitáfio e apenas esperam comodamente a hora do juízo final.

Os outros, a quem a imaginação ajuda, e a vontade se renasce, e a quem a maré preia não aniquila o sonho, reconstroem seus castelos na próxima maré vaza… mesmo que seja apenas até a maré preia voltar!
apl in "Crónicas Dispersas"