segunda-feira, 31 de agosto de 2009

A TABACARIA DO SR. ANTÓNIO




Aquela rua movimentada está diferente.
As grandes marcas capturaram as vitrinas
transformando-as em montras cobiçadas de luz
onde os olhos padecem e sonham sonhos desiguais.
Só a Tabacaria do Sr. António continua igual
naquela porta que também dá acesso ao primeiro andar
onde a luz se esconde atrás do bafio das escadas velhas .
A Tabacaria do Sr. António não tem luz nem vitrinas novas.
Apenas as rugas que o tempo transformou em velhice
iguais às rugas da velhice do Sr. António
iguais à velhice das rugas dos clientes do Sr. António.
E esses parecem querer acabar no tempo,
que o tempo os tem levado, como um dia levará o Sr. António.
Hoje os jovens não lêem o jornal. Passam os olhos nas letras
gordas, enquanto o café é devorado em segundos
porque o tempo não deixa tempo para mais.
Aqueles a quem resta tempo, partilham o jornal
no café da esquina mais perto de casa, no intervalo
de um qualquer jogo de futebol.
Mesmo assim, o Sr. António continua naquele sorriso
espelhado nos dentes desiguais àqueles que outrora foram seus,
a entregar todos os dias o jornal aos clientes,
enquanto vai comentando as notícias que enchem
a primeira página de um qualquer jornal.
Um dia, um senhor de fato e gravata entrara-lhe na Tabacaria.
Mas não queria o jornal.
Queria a Tabacaria!
Não queria aquelas prateleiras velhas.
Queria a Tabacaria!
Não queria o sorriso do Sr. António
Porque sem Tabacaria o Sr. António não sorri.
Só queria a Tabacaria!

apl in “Mentes Perversas”