quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

ELES LEVAM TUDO




Eles levam tudo

Soltem os uivos à noite
Porque o chão já não tem uvas.
O mar está seco
Mesmo sem estio
Como se o leito de qualquer rio
Já não tivesse imensidão.

Eles levam tudo
Eles levam tudo
Até as uvas do chão.

E vós que direis?
Açoitados no corpo
Fustigados na alma
Roubados na honra
Extorquidos na justiça
Não sois mais que a cobiça
Da devassidão do poder.

Eles levam tudo
Eles levam tudo
Até o pão para comer.

E o povo morre à fome
Morre à fome sem ter pão.

Eles levam tudo
Eles levam tudo
Até as uvas do chão.

ana paula lavado © 

(foto do google)

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

VERSO



Verso

o claro silêncio das palavras
plácidas ou inquietas
no espaço inefável do universo,

plasmadas uniformemente
isentas de risco calculado
são a linha improferível de um verso.

ana paula lavado © 

 (foto do google)

A TUA BOCA



A tua boca

O que desejo tantas vezes da tua boca
Esmerando os anseios, por ser tão pouca
As vezes que a tenho por inteiro.

E quando a tenho, que mais eu quero?
Tenho tudo, tudo aquilo que espero
Fazer da tua boca, o meu cativeiro.

ana paula lavado © 

(foto do google)

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

O MEU POEMA SEM NOME



O meu Poema sem Nome

De que nos serve, na quarta à noite,
naquele bar de artistas,
confundirmos a personagem
e tomarmos para nós
o papel principal!
Nem a solidão nos abandona sem deixar recado,
nem as palavras que são ditas
com coragem ou com despudor,
nos alheiam da nossa memória.
Os olhares vagueiam,
os rostos transfiguram-se,
distraídos do cansaço
ou submersos num copo de agonia!
Esquecem-se as vontades e as dores,
enquanto a noite
se prolonga e desajusta da hora marcada.
O silêncio absorve-nos, arrebata-nos
e alheia-nos da verdade.
Só a solidão se senta a nosso lado e nos provoca.
Sorri, maldosa e incomplacente,
e vai-nos enchendo
o copo vazio com outra dor.
Mas a alma permanece intacta.
Resiste estoicamente,
trazendo dentro de si mais uma poesia sem nome,
dolorosa ou sem pudor,
que vai enchendo de ouro
um qualquer papel amarrotado
onde se escreve
um qualquer poema sem nome!

ana paula lavado in UM BEIJO...SEM NOME, Corpos Editora, 2008

(aguarela de Henrique do Vale)

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

ANTES QUE SEJA TARDE




Antes que seja tarde

Antes que seja tarde
e os lírios feneçam com a invernia
antes que as noites desonrem o dia
e os rios sequem no estio
antes que o mar se inunde em vazio
e antes que seja tarde,

antes que seja tarde
e a maré preia se encarcere
antes que o sol se desterre
e os azuis se tornem breu
antes que se ausente o céu
e antes que seja tarde,

antes que seja tarde
e a madrugada embacie a fantasia
antes que a vida seja heresia
e o destino se torne acusador
antes que a vida feneça em dor
e antes que seja tarde,

antes que seja tarde
eu vou amar-te, meu amor
eu vou amar-te, meu amor!

ana paula lavado ©  

domingo, 20 de janeiro de 2013

VESTI-ME DE TI



Vesti-me de Ti!

Como eu gostava de me morrer
na linha infinda de um poema.

De alma nua entrego
no deslizar dos dedos
a fragrância do meu perfume
colhido ao acaso.

E num indisfarçável desejo
concebo-te sem hora marcada.

Fui tua nesta jornada
de impensável sedução.
Nesta escandalosa ânsia
de sentir minha nudez
e vesti-la de ti.

E neste prazer insaciável
de me morrer por te ter,

morro-me
na linha infinda de um poema!

ana paula lavado in "Um Beijo... Sem Nome", Corpos Editora, 2008

(foto do google)

sábado, 19 de janeiro de 2013

ILUSÕES




Ilusões

Repete-me as sílabas
Onde o sol se demora.
Porque as ilusões,
Essas já não me conhecem
E escondem-se disfarçadas
No seu vil egoísmo.

Vivo-me de degredo
Porque não permito à morte
Que me mate por destino.

ana paula lavado ©  

(foto do google)

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

A VELHA RUA




A velha rua

Há na velha rua mil pedaços
Há segredos desvairados e cansaços
Um velho pedinte que reclama graça
Uma corda pendurada com desgraça.
Há portas velhas com batentes des-tintados
As vizinhas que conjuram maus-olhados
Há o hálito quente do bêbado da taberna
E a puta que levanta a saia e mostra a perna.

Há na velha rua mil razões
Dos que ficaram por não terem mais tostões
Daqueles a quem o mundo é uma janela
Que só vêem o que se passa através dela.
Há os velhos de quem a vida se esqueceu
Os famintos que fazem da noite cor de breu
Os pregões que morreram na calçada
E a vida para quem a vida não vale nada.

Há na velha rua mil fadigas
Que escondem a amargura das intrigas
Há o sorriso amargo do velho desdentado
O rosto amarelo que outrora foi rosado.
Há a noite que se prolonga todo o dia
A penumbra que dantes era alegria
O cheiro a podre que se desfaz em desgraça
E o desprezo de quem já não lhe acha graça.

ana paula lavado © 

(foto do google) 

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

MARINHEIRO




Marinheiro

Espero por ti, marinheiro
Entre as madrugadas solitárias
Que não vejo
Senão o calor que ficou da última vez.

Quando voltas, marinheiro?
Quando incerto teu paradeiro
Revolto-me em águas atormentadas.

Porque sei, marinheiro
Que no cais onde param os navios
Tu revolves o mar num e noutro fervor.

Mas quando chegares, marinheiro
É no meu cais que te encontras, amor.

ana paula lavado © 

 (foto do google)

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

NÃO DIGAS QUE VAIS, MEU AMOR



Não digas que vais, meu amor

Ouve o grito longínquo dos astros
o aroma a trigo das sementeiras
o lamento do rio quando se morre
o perfume da flor nas amendoeiras.

Ouve a água no sibilar dos versos
A ânsia nocturna do entardecer
O clamor incendiado do deserto
O canto do rouxinol no alvorecer.

Não digas que vais,
meu amor,
que eu não poderei ouvir jamais.

ana paula lavado © 

(foto da internet) 

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

É FASCINANTE O AMOR




É fascinante o amor

É fascinante o amor
E vós não sabeis como achá-lo.

Há poucos, dizem os descrentes
Há nenhuns, dizem os cépticos.

Há os mornos
Há os frios
Os impossíveis
E os tardios
Há os queixosos
Os inocentes
Há os teimosos
E os maldizentes
Há os receosos
Os dissimulados
Os andrajosos
E os profanados
Há os que olham
Os que não querem ver
Há os que perecem
E os que nunca chegam a ser.

E há aquele, que quem conhece,
Vive por ele até morrer.

ana paula lavado © 

(foto da internet)

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

É ASSIM, ESTE AMOR




É assim, este amor

É assim, este amor que te entrego
sereno e cálido,
porque se pode amar de muitas feições
mas eu só conheço esta maneira.

Há maneiras mais quentes, eu sei
outras há que tombam fronteiras
e aqueloutras que incitam tempestades.

Mas a mais forte que derruba as demais
é saber-te como fogo no peito
e sentir sem dizer o que sinto
porque amo de outra maneira.

ana paula lavado © 

(foto da internet) 


DEVAGAR



Devagar

Amo-te devagar
Como devagar correm os dias
Que não têm pressa.

Não tenho pressa de te amar
Não tenho urgência no amor
Tenho apenas vontade de te amar
No silêncio perene do tempo
Devagar!

ana paula lavado © 

 (foto da internet)

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

NÃO SOMOS!




Não somos!

Somos o vento que canta
A árvore mais alta da serra
Somos a gente que fala
Os versos da nossa terra.
Somos os silvos da noite
A luz que vem de madrugada
O silêncio na voz dos que calam
Somos os errantes da estrada.

Somos tudo, somos nada
Somos a inconstância da vida
Somos os Invernos que matam
Somos a Primavera florida.

Somos reis do des-reinado
Governantes do deserto
Somos povo habituado
Ao castigo mais perverso.
Somos veste que nos cobre
Sem ganância nem grandeza
A injúria de quem comanda
A grata sorte da esperteza.
Somos aqueles que caiem
Sem eira nem beira no desatino
Somos pasto que nutre a seiva
Dos que marcam o destino.
Somos a voz gasta da tortura
A gaguez que move sem graça
Somos o lixo onde cospem
Os ditadores da desgraça.

Somos tudo, somos nada
Somos peças da disputa
Somos trapos que nos rasgam
Mas não somos Filhos-da-Puta!

ana paula lavado © 

(foto da internet) 

Morning

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

JÁ PASSAVA DA NOITE



Já passava da noite

Já passava da noite
quando junto ao cais da despedida
o silêncio intransmissível das sombras
esperava apenas o regresso.

Já passava da noite
quando junto às areias do oceano
apenas havia o pavio dos barcos
que caminhavam para a faina.

Já passava da noite
quando as sereias despertaram
e me trouxeram o sossego
do sabor quente do teu corpo.

ana paula lavado © 

(foto da internet)