quinta-feira, 28 de junho de 2012

ÁGUAS




Águas

Já esqueci a fome de todos os dias.
E em refinada loucura recomponho a lucidez
anarquizando o tempo que me subsiste.

Impossível dizer a que instante concebo as águas
ocultas na atmosfera estéril dum sonambulismo real.
Vão-se as horas de todos os tempos
marginalmente complexas e desajustadas
viajantes inúteis da eternidade alheia.

Recebo-te assim, em todas as horas
inclinando o véu à temperatura das águas
- porque as águas se querem límpidas e claras-
e mergulho na seiva que as ondas têm ao entardecer.

ana paula lavado ©

(foto retirada da internet)

terça-feira, 26 de junho de 2012

O NOSSO EU!




«Há uma questão incontornável - Em nós, mandamos nós.»

Atingir esse estádio, não é fácil. Aprendemos à nascença a sermos amparados e comandados, enquanto a absorção do que nos rodeia se vai tornando clara e realista. Crescer é quase um acto heróico, uma batalha em que temos que comandar o instinto, a vontade e os ensinamentos adquiridos. A vitória é alcançada no momento em que a nossa personalidade se vinca e podemos passar a ser donos do nosso Eu.

Será que nesse momento mandamos totalmente em nós?

O Homem é um animal de matilha. Não consegue viver isolado do clã que vai criando ao longo da vida. E mesmo sendo o chefe da matilha, as suas decisões e vontades estão sujeitas aos outros membros. Mesmo expressando a sua vontade, ela terá de ser maleável em função da vontade dos outros membros do grupo. E sendo dono de si, terá de ceder na sua vontade, para que haja consenso entre todas as partes.

Erradamente, cedemos em demasia. Alheamo-nos da nossa vontade e da nossa independência, em função do clã, que pensamos ser o ideal. Faz-se tudo em prol da matilha, para que ela cresça saudável e perfeita. A vida vai sendo delineada de acordo com as necessidades dos membros mais novos, e o objectivo é criar um mundo perfeito, à dimensão do nosso sonho. E sem nos apercebermos, vamos abdicando de nós em função da felicidade dos outros.

Estupidamente, deixamos que isso aconteça, pensando sempre no bem-estar da matilha, na sua protecção e na sua defesa. E quando o mundo se desmorona, urge juntar todos os pedaços, que mais não são, do que um ponto de partida para a sobrevivência.

Conseguir ter lucidez suficiente para nos apercebermos atempadamente, é quase uma segunda vitória. Conseguir inverter os factos é atingir a plenitude de si, e então passar a ser na realidade dono do seu EU.

A vida é uma sucessão de batalhas que todos os dias temos que enfrentar e lutar para vencer. Muitas se perdem, talvez por não se agir da forma correcta e no momento certo. Mas outras há, que se vencem com actos de heroicidade, o que faz com que metade do nosso Eu se sinta verdadeiramente orgulhoso.

Acomodamo-nos, mas nunca nos adaptamos. É impossível conviver com a hipocrisia, os falsos pudores, os falsos moralistas ou a falsas amizades. Tudo se põe à venda e tudo pode ser comprado ao maior ou menor preço. É inexequível conceber a mesquinhez e desdém com que se fala dos outros, sem a preocupação primeira de se olhar para dentro de si.

É possível que somente a loucura nos mantenha mentalmente sãos. A loucura de nos deixar levar pelo impulso, e não pelas «leis» da sociedade.

A única lei que vigorará terá de ser a da nossa consciência. E apenas assim se conquistará o ponto mais almejado do ser humano:

O NOSSO EU!

segunda-feira, 18 de junho de 2012

OS PÁSSAROS DO SUL



Os Pássaros do Sul

Nas folhas densas do tempo
tangendo os vértices da loucura
naufraguei enlameadamente.

As palavras, quase lágrimas,
imersas na palidez da memória,
morriam nas árvores de ramos descalços,
tão nuas como o tempo.

Procurei-te para lá das nascentes
onde os versos aclaram na limpidez das águas
como se fosse a vez primeira.

E na vez primeira,
desnudei a bruma
no voo dos pássaros que revinham do sul.

ana paula lavado ©




(foto retirada da internet)


quarta-feira, 13 de junho de 2012

FALA-ME DE TI




Fala-me de ti 



Fala-me do silêncio. 

Daquele que silenciámos na boca 

na secreta obscuridade das palavras. 



Fala-me das nuvens. 

Daquelas que cingem os sonhos 

que lentamente cinzelamos. 



Fala-me das montanhas. 

Daquelas que crescem nos orvalhos 

que alimentam a nossa sede. 



Fala-me do mar. 

Daquele que imerge dentro do corpo 

e desagua na ânsia da existência. 



Fala-me de ti. 

Daquele que me surpreende a quietude 

e desabotoa a minha nudez. 





ana paula lavado ©


(foto retirada da internet)

terça-feira, 12 de junho de 2012

SUSPEITA DE MIM


( "O Pensador" de Rodin )



Suspeita de mim 

porque não penso 

porque não digo 

porque não tormento. 



Porque não sei 

e avidamente procuro 

e quanto mais procuro 

menos sei. 



Ó terra infecunda 

inóspita e hominizada 

que me esventras 

que me ignoras 

que me arrogas 

de cegueira, 



toma meu corpo 

toma meu espírito 

por parceira. 



E que eu morra 

ínfima aprendiza 

nesta ignorância. 



Antes a insciência 

que a arrogância. 



ana paula lavado © 







quarta-feira, 6 de junho de 2012

ENQUANTO TE ESPERO



Tudo é triste 

Enquanto te espero. 



À luz da noite 

Recordo um verso esquecido 

Que me traga à boca 

O sabor da tua sede. 



E quando a Lua já não tem voz 

Imerjo o corpo no oceano 

Desaguando ninficamente 

No calor dos teus braços. 



ana paula lavado ©





segunda-feira, 4 de junho de 2012

OS LÍRIOS



Tenho em mim a melhor coisa do mundo, 

o amor. 

E com ele não necessito 

ir mais além que a minha firmeza. 

Floresçam as pétalas 

das rosas plantadas no jardim 

e o seu perfume 

perpetue o sentimento. 

E os lírios 

- singelos de delicadeza- 

me deixem adormentar 

na tranquilidade do amor. 



ana paula lavado ©